quarta-feira, 28 de setembro de 2011

O Pavão Queixando-se a Juno


Fábula de la Fontaine
 A Juno, o pavão se queixa,
Dizendo: Ó deusa celeste,
Com razão de murmuro,
Pela má voz que me deste.

Sou ave tua; e, se quero
Entoar os teus louvores,
Estrujo os campos em torno
Com meus guinchos troadores.

O rouxinol tão mesquinho
Deleita, se a voz levanta;
É honra da primavera;
De ouvi-lo, o mundo encanta!

Irada, se torna Juno:
“Cala-te, néscio invejoso!
Por que desejas as vozes
Do rouxinol sonoroso?”

De ricas pedras ornada
Não parece a tua cauda?
O listrão de Íris brilhante
Em teu colo flutua?

Ave nenhuma passeia
Que pareça tão bem;
Em si, ninguém reunir pode
Quantos dotes os mais têm.

Repartiu seus dons com todos,
A profícua Natureza;
Às águias coragem deu,
Deu aos falcões ligeireza;

Por presságio, o corvo grasna,
O mocho nas mortes pia,
A gralha males futuros
Com seu clamor pressagia.

Do que são se apraze todos;
E se torno a ouvir queixar-te,
Dar-te-ei voz de Filomela,
Mas hei de as plumas tirar-te.

Não quis o invejoso a troca;
Que é nosso instinto invejarmos
Sempre o que os outros possuem, Sem o que é nosso largarmos.

quinta-feira, 22 de setembro de 2011

FELIZ OSTARA!!!!!!



Ohh Deusa
Senhora da primavera
Corada pelas flores crescentes
Teu filho nascido nos rigores do inverno
Agora cresce
Amadurece
Tornaste novamente Donzela
Fértil
Nos meares desta terra fervilhante
Fervilhante de vida
Que adormecia sob os domínios do Rei Azevinho          
Despertas-te de teu sono
E contigo a natureza desabrocha
Nos meandros da vida
No curso incessante da roda do Ano
A hora de planejar
A tua tão esperada vinda
Para nos presentear com o verde
Dos caminhos antes buscados
Nas trilhas brancas
Agora vislumbradas
Sob as ramas da relva

quinta-feira, 8 de setembro de 2011

O canto da Deusa

Na sombra
Na luz
No quente
No frio
Habita minha essência
Ouve o meu chamado?
Minha voz ecoa nas noites cálidas
No trovejar das tempestades
No tilintar dos sinos
Nas brumas da noite
No açoite dos furacões
No acariciar da brisa
Durante o dia o doce calor
Que aquece tua face
São meus dons
Presentes aos meus filhos
Durante a noite
O luar...
O brilho prateado revela uma de minhas muitas faces
Quem és tu meu filho?
Dou-lhe a vida
Dou-lhe tua casa
Podes ouvir minha voz?
A cada dia se afasta mais de mim
Estou ao teu lado
Abraço-te em teus devaneios
Mas não posso trilhar teu caminho
Não se pode lutar contra o Destino
Sou teu Destino
Tua estrada
Tua direção
Mas, não sou eu os obstáculos
Você ergue muralhas que te impedem de chegar a mim
Não podes fugir do que és
Em teus passos vazios
Em tua mente solitária
A quem pedes ajuda?
Quem pode socorrê-lo?
Talvez chegaste a hora de voltares a meu ventre
Sob meu ventre
Pontilhado pelas jóias eternas
Jaz tu
Caminhas sobre tuas irmãs
A relva esmeralda
Com o fulgor de meus olhos
Venha a mim...
Ouça-me...
Ouça minha voz....

A mulher e a Arte da Magia


A magia é a essência que habita em todos nós. Um pulsar suave de nossa essência em contraste e ampliando o que nos cerca. Somos parte do todo e o todo é parte de nós. A nossa ligação com o mundo que nos cerca não é apenas ilusão.

Mas o que aconteceu? Porque olhamos para o céu e esquecemos da Terra? Não habitamos os céus, apesar de dele dependermos. Por que fechar os olhos para o que nós cerca e nos focarmos nas estrelas? O paraíso se encontra no céu? Quem nos legou este saber?
O céu representa o masculino, o ativo. Com o tempo nos focamos apenas no lado masculino e esquecemos a essência feminina. Quem é o ser da qual viemos? Viemos do útero materno. Não paterno.
Durante milênios, antes que o papel masculino na reprodução fosse descoberto, era a mulher dona dos filhos. Ela os gerou, fazem parte dela. A linhagem real era materna, não paterna, uma vez que a identidade do pai era extremamente discutível, mas a da mãe era inegável. Um homem não se sentava no trono, a não ser como consorte.
Dentre as tribos o papel e a influência feminina eram tão grandes que os homens se juntavam em grupos separados para fugirem ao julgo feminino. E também para terem seus próprios mistérios do Sagrado Masculino.
Os papeis só se inverteram com a descoberta do sêmen na geração. Os homens orgulhosos de serem os portadores da semente da vida, passaram a menosprezar a essência feminina.

Para os egípcios o Sêmen tinha o poder de gerar a vida. O que é contado no mito da criação de Heliópolis, que diz que Rá, copulou com o próprio punho, e que o sêmen ao tocar a terra, teve inicio a criação. Segundo o mito heliopolitano, Shu e Tefnut, o casal primordial surgiu do sêmen de Rá ao tocar o solo ou ao oceano primordial.
"Assim foste engendrado:
concebeste com a boca
e deste a luz de tua mão no prazer da ejaculação.
Eu sou o astro que se originou dos dois [dedos] de Rá."
(Texto Funerário, onde Shu fala sobre seu nascimento)

A pederastia dos gregos ia muito além de uma questão sexual, era uma questão educacional. Além de trasmitir conhecimento, os pederastas gregos trasmitiam através do sêmen a virilidade de uma maneira total, iniciando assim seus pupilos, não só nos mistérios da masculinidade, mas na própria sociedade.
Para os baruya, da Nova Guiné, um filho é o produto do esperma do homem. Uma vez dentro da mulher, porém, o esperma encontra-se misturado aos seus próprios líquidos. Se o esperma do homem vencer a água da mulher, a criança será um menino, caso contrário, será uma menina. Após a fecundação, o homem alimenta o feto por meio de coitos repetidos e o faz crescer no ventre da mãe. O esperma é o alimento que dá força à vida, e as mulheres enfraquecidas pela menstruação ou pelo parto bebem esperma. Um segredo dos homens baruya, que nenhuma mulher deve conhecer, é que o esperma dá a eles o poder de fazer renascer os jovens fora do ventre de suas mães, fora do mundo feminino, no mundo dos homens e apenas por eles. Assim que os jovens iniciados penetram na casa dos homens, são alimentados com esperma dos mais velhos. Essa ingestão é repetida durante vários anos, com a finalidade de fazê-los crescer mais e mais fortes. Para os baruya, o feto só se desenvolve graças ao esperma masculino. O leite com que mais tarde as crianças são alimentadas é o resultado desse esperma, já que, segundo eles, o leite da mulher nasce do esperma do homem.
(Retirado do blogg Falo- o Sagrado Masculino)

Vemos aqui o egocentrismo masculino. Devido o seu culto a força, impuseram sua vontade ao longo das eras vindouras.
Porém nem sempre foi como é hoje. A mãe é a força geradora, o poder da criação, a essência da magia vem do feminino, que é capaz de gerar. O masculino é uma parte da Deusa Mãe, amante, donzela, anciã assim como ela é pai, amante, jovem e ancião.
Das eras distantes temos apenas ecos da força feminina esquecida nos dias de hoje, mas aos poucos tentando ser recuperada.
O que nossa cultura representa? Por que a mulher é a portadora do pecado? Por que a mulher deve sofrer? A mulher é um ser irracional e inferior?
Por exemplo
“Acreditava-se que o sangue menstrual azedava o vinho, arruinava as colheitas, tirava o fio das lâminas, enferrujava os metais, e infectava as mordidas dos cães com um veneno incurável. Com poucas exceções, as mulheres eram tratadas como menores de idade vitalícios, sem quaisquer direitos legais ou de propriedade. A lei permitia que seus maridos batessem nelas; o estupro era encarado como uma forma menor de roubo. A educação das mulheres era desencorajada, pois uma mulher culta era considerada não apenas uma aberração, mas também um perigo.”
(Papisa Joana; Donna Woolfolk Cross)
                            
“ E vocês não sabem o que são Eva? [...] Vocês são o portão do diabo, o traidor da árvore, a primeira desertora da lei Divina; vocês são aquela que instigou aquele a quem o Diabo não ousou abordar [...] por causa da morte que vocês merecem, até o Filho de Deus teve de morrer.”
(Tertuliano, Padre Apostólico)
“ [...]É  mais amarga que a morte, porque a morte do corpo é um inimigo franco e terrível, mas a mulher é um inimigo lamuriento e secreto. E o fato de que é mais perigosa que uma armadilha, não falando das armadilhas dos caçadores, mas dos demônios. Pois os homens são capturados, não só por seus desejos carnais, quando vêem e ouvem às mulheres; mas, como diz São Bernardo: “Seu rosto é um vento quente, e sua voz o apito das serpentes”; e também provocam encantamentos em inúmeros homens e animais. E quando se diz que o coração delas é uma rede, se fala da inescrutável malícia que reina em seu coração. E suas mãos são como laços para amarrar, pois quando posam suas mãos sobre uma criatura para enfeitiçá-la, então, com a ajuda do demônio, executam seu desígnio.
Para terminar. Todas as bruxarias provem do apetite carnal que nas mulheres é insaciável. Vejam-se Provérbios XXX: “Há três coisas que nunca se fartam; ainda a quarta nunca diz basta”: a matriz estéril. Pelo qual, para satisfazer seus apetites, se unem inclusive aos demônios. Muitas outras razões deveríamos apresentar, mas para o entendimento está claro que não é de se estranhar que existam mais mulheres que homens infectadas pela heresia da bruxaria. E em conseqüência disso, é melhor chamar de heresia das bruxas do que dos bruxos, já que o nome deriva do grupo mais poderoso. E bendito seja o Altíssimo, que até hoje protegeu o sexo masculino de tão grave delito; pois Ele se mostrou disposto a nascer e sofrer por nós e, portanto concedeu esse privilégio aos homens.”
(Trecho de Malleus Maleficarium)

Em um período de trevas, onde a ignorância reinava, a corrupção era o centro, como era a mente da população? O que significava para uma mulher nascer em um meio que a tratava como um ser irracional, criado para parir e constantemente surrada por seu marido, ou melhor, seu dono? Um único passo fora, ou mesmo sem isso, um dia que seu “dono” estivesse de mau humor poderia espancá-la, ás vezes, até chegando a desfigurar seu rosto e corpo.
A mulher como ser para procriação, tinha, era sua obrigação, parir. E, preferivelmente um homem, uma vez que qual a utilidade de uma mulher?
As mulheres versadas na arte da natureza, que preparavam poções para aliviar a dor, as parteiras, eram consideradas bruxas. A mulher TEM que sentir dor, para expiar seus pecados, por cobiçar a MAÇÃ PROIBIDA
.
Por que a mulher? E não o homem, que possui o raciocínio mais lento e de menor percepção, uma vez que se concentra em sua força e não em sua mente?

 Porque a divindade máxima era uma mulher, uma Deusa, a divindade geradora e ancestral. Com uma nova crença surgindo, baseada na masculinidade, em um Pai, ao invés de uma mãe era necessário desacreditar a mulher e tudo lidado a ela (Por exemplo o lada esquerdo, dizemos que o lado esquerdo da azar, já se perguntou por que? Pois o esquerdo é o lado feminino, portanto fonte de pecado e também de azar). Quando sentimos medo, a quem recorremos?, ao pai ou a mãe, quem nos causa maior temor?
A nova crença necessitava extirpar as antigas raízes pagãs, a mulher deixou de ser divina, a humanidade deixou de cultuar a Terra e passou a cultuar os céus. E hoje temos o resultado de nossa escolha, nossa casa expira por nossas torpes escolhas. Destruir a Terra, porque ela representa a carnalidade, a inspiração de Satã, outra figura desvirtuada (seus chifres, símbolos de fertilidades, eram o símbolo do Deus pagão, e o que fazer com ele? Como estava enraizada na mente do povo, desvirtuaram a sua imagem, tornando-a assustadora, para afastar o povo do culto pagão).
“Não terás outros deuses diante de mim.” (O Segundo Livro de Moisés Chamado ÊXODO;CAPÍTULO 20: Os Dez Mandamentos). Se este Deus é onipotente, onipresente e onisciente, porque ele permitira a seus filhos terem outros Deuses quando tem o poder de impedir? Por causa do livre arbítrio de seus filhos? Será mesmo que seus filhos não conseguem ver sua grandiosidade, que este ser é supremo e que se manifesta de inúmeras formas a seus filhos, que não existe uma verdadeira e outra falsa? Que todas são um complemento?


Não há razão em destruir o que as mulheres são e representam em nome de um deus, uma vez que ele também é mulher, ele é o todo e o nada. Feminino e masculino. E seu caráter, sua forma de se manifestar não deve ser extirpado e sim respeitado.

Símbolo da antiga força feminina


Um exemplo disto é a Papisa Joana que teve seu papado entre os anos de 853 e 855. Porém a Igreja, no século XVII sob o constante ataque protestante, deu início a seus esforços para destruir os vergonhosos registros históricos sobre Joana. O desaparecimento quase completo de Joana da consciência moderna, apesar de durante a Idade Média e Renascença sua história tenha sido aceita pela Igreja, atesta sua eficácia. Em sua história vemos a luta feminina por uma reconquista, por idéias altruístas em um clero cada vez mais decadente e corrupto. A história de superação, força e dignidade.



As fogueiras da Inquisição arderam durante séculos, insufladas com os ventos da ignorância. Hoje em dia não nos encontramos tão diferentes dos antigos Inquisidores, apenas já não se ataca diretamente, mas sim por meios indiretos e lentos.
Devemos deixar novamente que este fogo apague nossos escritos, como fizeram em Alexandria? Já não basta de sermos relegados as sombras sob falsos julgos?




 

domingo, 4 de setembro de 2011

A imensidão

 A imensidão
O arco e a flecha
Apontados para um céu
Um céu brumoso
Onde o cinza torna tudo opaco
Sem vida
A melancolia dos céus é sentida em uma fina cortina de chuva que cai
Uma chuva gélida
Desprovida de calor
De vida
Apenas um esboçar
Um esboçar de um vago amor
De uma aceitação
Desprovida de razão
Um arder brando
E sombrio...
Minha pele eriça-se sob este toque macio
Por quê?
O que faço nesta montanha?
Olhando para esta vastidão branca...
Sem cores...
Sem vida...
Não me lembro da razão de estar aqui
Mas porto um arco
Um aljava
E nela
Sete setas...
Setas  translúcidas com a sombra de antigas cores
Talvez as cores do arco-íris
 Não posso dizer
Mas...
Uma flecha paira em minhas mãos
Prateada
Como a luz da lua se refletindo em um plácido lago
Mas a placidez é conturbada
Ondas se espalham pela superfície
Talvez....
Não...
Não pode ser...
Essa brancura me lembra esta flecha
E...
A ponta se encontra maculada
Maculada...
Por sangue...
Um gota escorre
Vejo-a cair
Suavemente sobre a neve
Manchando a branquidão
Mas esta não é a única gota
A macular a veludez da neve
Acompanho um fluido...
Ele forma uma linha continua na neve
Um risco vermelho
Descendo a montanha
Pelos vales
Uma linha rubra em meio ao branco incessante
De onde vem?
Percebo em meu braço esquerdo, que porta o arco
Um fluido quente
É este líquido que macula a brancura
Por quê?
Por que ele escorre de mim?
Me sinto fraca
Minha vida se esvai lentamente...
Mas também...
É como se o mundo
Também morresse
Ao longe...
Vindo até mim
Vejo um ser
Trazendo uma suave brisa
Levantando meus cabelos
Posso senti-los
Eles esvoaçam
Esvoaçam para formar a cortina que separa os mundos
O véu de um sono eterno
O ondular dourado...
Desvio o olhar
Concentro-me em meu sangue
A cada gota...
Um novo começo
Ou talvez um fim
Um fim para mim?
Ou para o mundo?
Quem está perecendo?
Então começo a esmorecer
Ajoelho-me
A última gota cai
E com ela minha consciência
De minhas mãos caem o arco e a flecha  prateada
Desfazem-se sob o toque da neve
Não existem mais...
Antes de tocar a neve
O ser ampara-me
Em seus braços cálidos
Sinto a presença de algo eterno
Quem será que me ampara?
“Sou a vida
Sou a morte
Sou o que há
E o que não há
Vim levá-la
Sua missão acabou”
“Acabou?”
“Não precisas mais dar tua vida. O mundo perece. Já não é capaz de salvá-lo”
“Salvar?”
“Venha comigo. Chegou sua hora. Não possui mais sangue para dar pelo mundo’
“Vejo apenas o nada. Por que não consigo ver?”
“Porque a razão de sua visão acabou. Não precisas mais ver o que te cerca. Lembra da imensidão branca riscada apenas pelo vermelho?
“Sim”
“Agora o vermelho de seu sangue espalha-se. Praticamente não há mais branco. O mundo a sacrificou, você é sua própria oferenda. Mas... Já não há mais salvação...
Chegou a hora de dormires eternamente, após sua ardorosa luta  por estes seres”
Posso sentir as mãos do ser cobrindo meus olhos e me fazendo dormir
O sono eterno
A eternidade...
Ela me parece tão vasta
E sem sentido
Mas...
Estou...
Dizendo Adeus aos seres...
Um lágrima escorre de meus olhos
 





Canto Africano

Canto Africano
Eu vejo teu solo repleto de vida,
Teu povo feliz, vivendo em harmonia.
Escuto teu canto, acompanho tua lida,
Na caça, na pesca, em teu dia a dia.
Tua gente é alegre e vive integrada
À mãe natureza, bondade e abrigo.
Fonte de amor, também, muito amada,
Por quem é feliz, vivendo contigo.
Teus filhos são fortes, guerreiros valentes Que cortam as savanas, sentindo os açoites Dos ventos que sopram histórias dolentes, Enquanto eles dançam, cantando nas noites. Durante o repouso, buscando sua origem, Nas asas do sono, teus filhos deliram
E quando despertam daquela vertigem,
Há só a lembrança, os deuses partiram.
E tal qual estrelas correndo nos céus,
Fugindo do sol em cada amanhecer,
Os deuses retornam, envoltos nos veús
De corpos suados, de mãos a tremer.
E chegam ditando regras p'ra vida,
E ensinam lições muito bem ajustadas.
A todos suplicam, ao amor dê guarida,
Assim como nesta e noutras jornadas.
E por noites e dias, teus filhos viveram, Em liberdade, labuta constante,
Enquanto nas noites, os sons dos terreiros Falava da vida num mundo distante.
Um dia, porém, agitou-se a savana
E teu povo julgou assistir a chegada
de deuses descendo em caravana
E
busca da África, sua filha amada.

Mas logo notou, com olhar de tristeza:
Aqueles não eram santos da noite.
De armas em punho, exibiam rudeza,
Enquanto faziam estalar o açoite.
Pegavam teus filhos e filhas tão belas, De pele de ébano, dentes de marfim.
Metiam-nos à ferros, como se feras,
Levadas aos circos de terras sem fim.
E em longas noites cheias de agonia
Viveram suas horas de drama e horror
E dilacerada a África sofria,
Saudade dos filhos, cevada de dor.
E na travessia longa e penosa,
Os braços da morte logo acolheu
Bravos e belas que a vida inditosa
Matou a esperança e por fim, feneceu.
Um dia, cansados, numa terra estranha
Carpindo, chegaram os sobreviventes,
Farrapos tomados de dor tamanha,
Arrastando no solo pesadas correntes.
Da terra distante, só a doce lembrança, Nas horas difíceis do duro labor.
Somente a saudade, somente a esperança, Em gota orvalhada do bálsamo do amor.
E aí, pouco a pouco, a alma dorida,
Ao som de atabaques nas noites escuras, Indagou dos deuses da África perdida:
Por que esta vida de exílio e amarguras? E os deuses, atentos, falaram aos aflitos: Meus filhos, a dor que os faz padecer,
São velhos lamentos, gemidos e gritos
Daqueles que, ontem, fizeram sofrer.
Se querem purgar os erros de outrora,
Aceitem, contritos, a dor do momento,
Amem esta terra e ensinem, agora,
Que só o amor elimina o tormento.
E então, cada noite se encheu de repente, De um hino de paz, em cada terreiro.
Era o negro sofrido, que em canto dolente, Plantava o amor em seu cativeiro.

sábado, 3 de setembro de 2011

Píramo e Tisbe

Píramo e Tisbe
 
Há muitos e muitos anos, vivia na babilônia um rapaz chamado Píramo, o mais belo dos jovens de seu tempo. Bem ao lado da casa dele, separada apenas por muro, vivia Tisbe, a mais linda jovem do oriente. Sendo vizinhos, acabaram se encontrando e ficando amigos. Mais que isso, em pouco tempo aquela amizade virou amor e começaram a falar em casamento. Acontece, porém, que as famílias não queriam aquela união e proibiram o namoro. Os dois não podiam se falar. Como não tinham um aliado ou confidente que pudesse levar seus recados e ajudá-los, foram desenvolvendo uma linguagem de sinais e acenos. Quanto mais se ocultavam, mais o amor escondido ardia e abrasava.
No muro que separava os dois quintais havia uma rachadura, que tinha virado uma fresta. Tão apertada que passara despercebida de todos. Mas nada escapa aos olhos dos apaixonados! Píramo e Tisbe descobriram essa fresta e logo notaram que podia ser um canal para suas vozes. Píramo parava de um lado, Tisbe do outro, e começavam a ouvir a respiração do ser amado ali pertinho. Daí a pouco sussurrando:
-Muro, muro, deixe de ser ciumento... não fique no caminho dos que se ama! Por que não deixa que a gente se abrace?
-Por favor, muro, se abra mais, para podermos nos beijar...
Passavam o dia todo murmurando ao lado do paredão. De noite, se despediam e beijavam as pedras do muro.
Certa manhã, quando a aurora apagara o fogo das estrelas, e os raios do sol já tinham secado o orvalho da noite, os dois chegaram ao ponto de encontro e, como sempre, começaram a suspirar. Mas estavam muito tristes. Seus lamentos foram ficando cada vez mais sofridos. Não estavam agüentando mais. Por isso, acabaram resolvendo que naquela noite, cada um tentaria esgueirar-se, passar pelos guardas e escapulir da casa. Depois que fugissem, iriam encontrar-se fora da cidade. Para  não se perderem, marcaram um encontro junto a um túmulo que havia no campo, ao lado de uma imensa amoreira – porque a sombra da árvore podia ajudar a escondê-los, no caso de eventuais olhares indiscretos. E, como bem pertinho havia uma fonte de água fresca, seria um lugar perfeito para uma espera.
Quando a noite chegou, Tisbe conseguiu abrir a porta e sair com facilidade, sem que ninguém a visse. Envolta num véu, chegou ao local combinado e sentou-se debaixo da amoreira, cujos frutos nesse tempo eram branquinhos como a neve e brilhavam sob a lua. Mas daí a pouco, apareceu uma loa que acabava de caçar e, ainda com  boca gotejando sangue, vinha beber água na fonte. À luz do luar, Tisbe viu o animal se aproximando e correu para se abrigar numa caverna próxima. Na corrida, deixou cair o véu. A leoa encontrou o tecido e avançou sobre ele, rasgando o pano e deixando todo sujo de sangue. Depois, bebeu água e foi embora.

Píramo só conseguiu chegar um pouco mais tarde. Viu as pegadas e ficou pálido. Pior ainda, viu o véu de Tisbe estraçalhado e ensangüentado. Desesperou-se. Achou-se que Tisbe tinha sido devorada por um leão e a culpa era dele, que a convencera a ir sozinha de noite a um lugar perigoso e não conseguira chegar a tempopara estar lá a sua espera. Chorando, abraçado ao véu de Tisbe, sacou a espada e a enterrou no próprio peito. O sangue jorrou longe e abundante, e esguichou sobre a raiz da amoreira e sobre as amoras, que foram tingidas por aquela cor púrpura.
Ansiosa para não desapontar seu amado, Tisbe voltou, olhando em volta à procura dele, e louca para lhe contar sua aventura e o perigo de que tinha escapado. Quando viu príamo no chão coberto de sangue, no chão, morto, ficou fora de si. Batia no próprio peito, arrancava os cabelos, lavava o sangue dele com lágrimas, beijava o rosto frio. Ao distinguir que  as mãos do rapaz seguravam seu véu rasgado e a espada estava fora da bainha, percebeu o que ocorrera. Segurou então a espada com firmeza e se lançou sobre ela para morrer também, no aço ainda quente do corpo amado. Com tristeza, os deuses guardaram para sempre a lembrança dos dois nos frutos da amoreira – cor de sangue antes de amadurecer, e pretos de luto no apogeu da doçura, quando ficam no ponto para serem colhidos. E, ao amanhecer, as duas famílias, finalmente, constatando a que ponto sua intransigência tinha levado os dois namorados, conseguiram as cinzas na mesma urna.



sexta-feira, 2 de setembro de 2011

A semente da verdade



A semente da verdade
 
O imperador, com seu longo reinado sentia a visita amiga da morte, porém não possuia um herdeiro para deixar seu trono. Sem saída para lidar com seu impasse, pede auxílio a seus conselheiros e juntos decidem convocar as crianças do reino.
Thai foi uma delas. De origem humilde, mas dedicado a sua família e sua casa, cuidando de seu jardim, onde cada planta tocada por ele crescia viçosa e forte.
No dia marcado, dirigiu-se ao palácio, onde, além de si encontrava-se milhares de pequenos súditos.
O imperador disse:
- O Futuro da nação diante de mim. Pequenas crianças, meu sucessor se encontra entre vocês. Darlhe-eis uma tarefa. Vejam estas sementes. Devem cultivá-las. O trono será daquele que me trouxer, daqui a um ano, a planta mais bela.
Thai, um excelente jardineiro, sentia-se confiante em sua tarefa. Porém o tempo passava, e por mais que se esforçasse, a semente não germinava. O menino dedicava-se noite e dia a pequena semente, sem resultado algum.
E após um ano, novamente devia se apresentar ao imperador com sua planta. Mas a semente de Thai não havia germinado e o menino desesperava-se, e sentia-se inferior as outras crianças, que provavelmente teriam conseguido belas plantas. Porém seu avô lhe disse:
- Você é honesto. Vá ao imperador e diga a verdade. Sua dedicação foi máxima, mas a semente não brotou. Não se envergonhe, querido, apenas explique o que fizestes, pois devemos sempre agir com honestidade, buscando a felicidade, sem que a nossa alegria faça alguém infeliz.
Thai obedeceu ao avô e seguiu em direção ao palácio. Entretanto ao chegar lá, ficou assustado, pois era a única criança a não trazer consigo uma belíssima planta.
O imperador chamava as crianças e examinava os vasos. Não sorria e nem esboçava contentamento.
Thai tremia de ansiedade, pois se o imperador não havia até então aprovado aquelas plantas maravilhosas, o que não diria de seu vaso sem nada?
Thai foi ficando para trás e, quando se deu conta, era o último da fila. Mas sua vez chegou, e ele não poderia adiar mais o encontro com o imperador.
- Vejamos, meu jovem, o que tem para me mostrar.
Thai não pôde mais evitar as lágrimas. Com a cabeça baixa, mostrou o vaso ao imperador e disse:
- Senhor, sou um jardineiro e uma de minhas virtudes é a perseverança, mas por mais que eu tenha me esforçado, a semente não brotou. Meu avô ajudou a pensar sobre o que fazer e optei por dizer a verdade, contar meu esforço e pedir-lhe perdão.
- Não se envergonhe, criança, você fez o certo. A sua grande virtude foi dizer a verdade, pois eu havia queimado todas as sementes e nenhuma poderia germinar. Portanto, você foi o único que, de fato, plantou a semente da verdade.



Nesta bela história vemos o quanto às pessoas buscam agradar aos outros imaginando fazer o certo, mesmo que não sejamos verdadeiros e honestos conosco e com os outros.
Buscamos o lucro que obteremos, não a sinceridade.
A semente destacada demonstra que ao longo da vida plantamos inúmeras sementes que irão prosperar ou não de acordo com os nossos cuidados e caso ela não floresça não é comprando uma nova que obteremos o que desejamos.
A arte da jardinagem nos molda, molda quem somos e quem viremos a ser. Somos nossos próprios jardineiros e também a semente a germinar. Porém não germinará sem cuidados e dedicação.
Não é com um pouco de água um dia sim e outro não que iremos crescer e frutificar.
A perseverança é a energia e a dedicação a água, para a semente de nossa vida.
Não podemos nos dedicar por um tempo e simplesmente desistir porque ela não germina e frutifica no tempo que esperamos. Muitas vezes quando ela está prestes a tornar-se uma bela planta tiramos nossos cuidados porque desistimos sem tentar. A semente morre antes de poder se desenvolver plenamente.
Permitiremos sermos um botão que não abre e atinge seu ápice?



quinta-feira, 1 de setembro de 2011

Com A Cruz Alheia

Com  A Cruz Alheia

Existem momentos na vida em que olhamos para trás e o que vemos é uma vida vazia, estranha, uma vida para qual nunca esperaríamos chegar. Neste momento nossos fracassos nos arrebatam e ficamos a mercê do destino. Buscamos um modo de cobrir o buraco em nossa alma e procuramos a saída ao nosso redor e nos outros.
Quantos não sonham, no momento em chegam ao fim da estrada, e descobrem que estão em um beco sem saída, encontrar a saída sendo outra pessoa, tendo outra vida, uma existência totalmente alienada a sua?
John o personagem principal da história teve esse sonho realizado, mas descobrimos que sonhos que se realizam não são contos de fadas. Ao caminhar pelas ruas apinhadas da França, um país da qual não é descendente, mas estudara a língua e história, John dá-se conta de que nunca faria parte daquelas pessoas, de suas vidas. Até agora fora apenas um professor de uma universidade de Londres, professor de que todos os alunos conheciam o rosto, vagamente familiar sem se lembrarem o nome. Sozinho, sem família nenhuma. Refletindo sobre sua vida tenta achar à forma de livrar-se dos fracassos em uma viagem de férias a França. Perambulando pelas ruas John esbarra em Jean, um sósia seu, uma verdadeira cópia, totalmente idêntico, até mesmo na voz. Os dois saem para conversar e contam suas histórias um ao outro. Jean diz que adoraria trocar sua vida familiar e exaustiva pela vida solitária e tediosa de John.
No dia seguinte ao acordar, John encontra-se com as roupas e pertences de Jean e seu mordomo esperando para levá-lo a sua casa, a casa de Jean. John acaba aceitando a bizarra brincadeira e torna-se um burguês nobre.
A partir deste ponto a história é conduzida por John portando-se como Jean, o Monsieur le comte, somos levados às introspecções de John e descobrimos uma família a beira da ruína, desgastada, tudo por causa de Jean, John decide transformar esta família e toma as rédeas da situação tomando as melhores soluções para cada membro da família.
O mais belo do livro é o questionamento que o personagem faz sobre sua própria vida, estamos sempre distantes e esquecemos que nossa vida é curta e pode ser um fracasso se não nos dedicar-mos a ela. A idéia de trocarmos com outra pessoa a vida e desfrutar a vida do outro pode parecer absurda, mas nós podemos nos transformar em seres diferentes, dentro de nós existem diversas personalidades e cada uma entra em ação no tempo certo, a autora demonstra isso com o final do texto, podemos mudar e enfrentar as dificuldades da vida, o passado é passado se quer realmente mudar é preciso esquecê-lo e seguir adiante.



Com a Cruz Alheia
Autor: Daphne Du Maurier
Editora: Seleções Reader’s Digest
Número de páginas: 168
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